Geometria sobre o conforto

De à sombra do futuro
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Geometria sobre o conforto

Felipe Bittencourt


O desenho no chão delineia o espaço para um corpo. Tal qual as marcas deixadas pela perícia na cena de um crime, circunscreve a área de um corpo ao cair. A forma, todavia, não é aquela de um corpo organicamente dividido em seus principais membros, senão uma abstração geométrica dessa divisão, um loteamento quadrangular das áreas respectivamente atingidas por suas extremidades no momento de uma queda.

Contrastada com o corpo do artista, que freneticamente se lança contra o desenho no chão, este esquema ganha um aspecto irônico e trágico: racionaliza a presença do corpo a partir da expectativa de seu vôo e queda, determinando não simplesmente o local dessa ação, mas, sobretudo, o modo como ela deve se dar. Os cincos quadrados circunscritos pelo retângulo maior não demarcam somente o local do pouso de cabeça, braços e pés, mas, antes disso, tornam tais pontos imperativos à manobra cíclica empreendida pelo perfomer: obrigam-no a estirar seus membros de modo a não oferecerem resistência ao encontro com o solo.

A tensão aqui posta entre racionalidade e corpo é clara: não sabemos precisar exatamente se é, por um lado, a obstinação auto-flagelante do corpo que configura a geometria sádica do chão, ou se, por outro, é exatamente esta o que inflige ao sujeito sua condição masoquista. No entanto, de um modo ou de outro, o cômputo geral é o mesmo: a inexorável falência de um vôo em cujo alçar se encontra embutido, desde de início, a violência e brutalidade da queda e do fracasso.